7.11.04



vaias na despedida
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))) Pierce humilhou os Knicks


* De Nova York

Cá entre nós, que ninguém nos ouça. Parece que eu não dou muita sorte para os times da casa. Após sete dias na terra de George Bush, o Rebote fecha sua miniturnê com três partidas, três ginásios diferentes e três sovas a favor dos visitantes. Heat, Sixers e Knicks que me perdoem. E fiquem tranqüilos, que eu já estou de saída.

A noite de sábado ferveu em Nova York. A estréia do time local no Madison Square Garden mexeu com a cidade e, a dez quadras do ginásio, os cambistas já gritavam pelas esquinas. Até no Radio City Music Hall, que tinha show programado para o mesmo horário, o assunto era basquete. “Knicks tickets, Knicks tickets”, era o que mais se ouvia nas cercanias da famosa casa de shows.

Depois do perrengue em Nova Jersey e na Filadélfia, o departamento de imprensa funcionou direitinho desta vez. Quando cheguei à entrada dos jornalistas, minha credencial era a primeira da pilha. Elevador até o sexto andar, portão 64, fila C, meu nome na mesa, tudo muito fácil. Em vez dos japoneses que me acompanharam no jogo dos Sixers, no Madison fiquei cercado de pesos pesados: ESPN, grandes estações de rádio e até o correspondente do L’Equipe, da França, que sentou ao meu lado.

Na apresentação do Boston Celtics, deu para sentir pela primeira vez a fúria dos nova-iorquinos: Paul Pierce e Gary Payton levaram uma vaia ensurdecedora. Mais tarde, os uivos da torcida se voltariam para a prata da casa, mas àquela altura os fãs só queriam saber de festa. Quando o locutor apresentou o quinteto titular do New York, o edifício tremeu. Coube ao jovem Jamal Crawford, uma das poucas caras novas do time, fazer a saudação para as arquibancadas.

O povo gostou e aplaudiu de pé.

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))) O jogo


))) Sweetney tentou, mas pouco conseguiu


Estava tudo perfeito e assim continuaria se não fosse um pequeno detalhe: havia ali um jogo de basquete a ser disputado, e o Boston não estava a fim de festa. Pierce começou em ritmo acelerado, marcando seis pontos logo de cara. Payton parecia um garoto na armação, trocando bons passes e chutando com precisão. O primeiro quarto terminou com oito pontos de diferença para os visitantes, e o buraco só aumentou dali para frente.

Preocupado, o técnico Lenny Wilkens voltou para o segundo período com o calouro Trevor Ariza em quadra. Muito aplaudido, o rapaz correspondeu às expectativas e mostrou que pode ser uma peça importante na rotação do New York. Michael Sweetnei também entrou com vontade, marcando 18 pontos, mas ontem não era o dia. O time cometia erros bizarros, não ganhava um rebote sequer e abria verdadeiras avenidas na defesa. Os Celtics foram se aproveitando e, no intervalo, já venciam por 55-36.

Foi aí que as vaias mudaram de lado.

Impaciente, a torcida começou a bufar a cada tropeço. Logo no início do terceiro quarto, completou-se o desastre. A diferença chegou a três dezenas de pontos e qualquer chance de reação foi por água abaixo. No período final, o que se viu foi um jogo sem graça. Doc Rivers manteve seus titulares em quadra, mas Wilkens foi lançando os reservas.

Resultado: um humilhante 107-73. O que era para ser uma estréia festiva virou uma derrota vergonhosa por 34 pontos. E a torcida vaiou, vaiou, vaiou...

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))) O pós-jogo

Em busca de uma explicação, os jornalistas foram direto ao vestiário dos Knicks, que ainda estava fechado. De lá saiu Lenny Wilkens, para uma rápida entrevista na sala de imprensa. Diante de uma dúzia de repórteres, o treinador não poupou os atletas:

“O que aconteceu hoje foi devastador. Precisamos entender que, no basquete, tudo começa na defesa. Não fizemos nosso dever de casa e caímos num buraco. É claro que não gostamos quando a torcida vaia, afinal esta é a nossa casa e nós precisamos de apoio. Mas, por outro lado, não podemos deixar alguém entrar na nossa casa e fazer o que eles fizeram hoje conosco”.

Dei uma passada rápida no vestiário do Boston, onde Gary Payton, já de terno marrom, colhia os louros da vitória. Paul Pierce tinha ido embora e haviam sobrado poucos jogadores. Para não perder tempo, fui direto caçar explicações dos jogadores do New York.

O clima na sala era de velório. Assim que entrei, literalmente trombei com Walt Frazier. Sem saber o que fazer diante de uma lenda do basquete, pedi desculpas e ouvi dele um comentário rápido sobre o jogo: “Esses caras não mostraram a menor energia hoje”. Valeu a noite.

Stephon Marbury, que esteve muito mal na partida, confirmou o diagnóstico de Frazier. Com um paletó meio estranho, que definitivamente não combinava com nenhuma outra peça de roupa, o armador falava quase para dentro, envergonhado com o que acabara de apresentar à torcida.

“Quando o tempo vai passando, você sempre acha que pode reagir, que pode fazer algo diferente. Hoje não deu. Em todos os aspectos do jogo, fomos muito mal. Não importa se perdemos por um ponto ou por 50, sempre ficarmos chateados com uma derrota”, explicou.

Quando o repórter da rádio ESPN perguntou sobre as fortes vaias que vieram das arquibancadas, Marbury foi ainda mais incisivo que Lenny Wilkens: “Se eu fosse torcedor, também vaiaria. Eles têm toda razão. É inconcebível jogarmos desse jeito em Nova York. Não dá para acreditar”.

Shandon Anderson, Tim Thomas, Jamal Crawford, todos foram saindo devagar, cabisbaixos e claramente abatidos. O último a deixar o vestiário foi o pivô titular Nazr Mohammed, que até começou bem a partida, mas depois afundou com o resto do time. “Eu gostaria muito de ter uma resposta sobre o que aconteceu hoje, mas infelizmente não tenho”, resumiu o grandalhão, colocando o ponto final numa noite de vergonha para o New York Knicks e, principalmente, para sua apaixonada torcida.

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Apesar dos percalços, a viagem valeu a pena. No geral, deu para ter uma visão diferente do esporte, conhecendo jogadores e técnicos de perto. Volto ao Brasil hoje à noite, levando na bagagem muitas fotos, algumas compras e inúmeras recordações legais. Obrigado a vocês, guerreiros, que aturaram esses textos gigantes sem reclamar. Não liguem para as baixarias nos comentários, depois isso se resolve. Durante a semana, o Rebote retoma seu ritmo normal.

Um forte abraço a todos.


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foto. nbae

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