17.6.03
O NOVO REI DO GARRAFÃO
Se tudo correr como planejado, amanhã San Antonio vai parar. Na alegre cidade texana, quarta-feira será dia de matar aula, faltar ao trabalho e cancelar qualquer espécie de compromisso. Do início da manhã ao fim da noite, todas as atenções estarão voltadas para os Spurs, heróis locais que acabam de conquistar o segundo título da NBA.
Artistas, políticos, ex-atletas e uma massa ensandecida de 300 mil pessoas prometem cobrir de honras os jogadores e a comissão técnica da equipe campeã. Entre todos os homenageados, alguns merecem uma dose extra de palmas. Os velhinhos David Robinson, Steve Kerr e Kevin Willis; os guerreiros Manu Ginobili e Malik Rose; o técnico do ano, Gregg Popovich. Entre todos eles, no entanto, ninguém é mais merecedor dessa festa do que o impressionante Tim Duncan.
Aos 27 anos, com dois troféus e dois prêmios de MVP, ele parece ainda não ter assimilado o status de estrela. Ainda não capitalizou financeiramente o potencial dos grandes astros da liga. Talvez este dia nunca chegue, e não há mal algum nessa ausência de ganância. Quem procura garoto-propaganda é dono de multinacional. Os amantes do basquete querem vê-lo executando sua arte embaixo da cesta, e não vendendo tênis ou refrigerante. Não importa que o mundo dos grandes negócios continue negando ao craque do San Antonio as cifras milionárias que entopem os cofres de Kobe, T-Mac e Iverson. Sendo assim, ele poderá se dedicar exclusivamente a pontos, tocos, rebotes e assistências.
“Tim Duncan é um chato”, disse outro dia um analista de marketing esportivo. Não tenho dúvidas de que, na quadra, os oponentes têm a mesma opinião. Como é enjoado aquele indivíduo com cara de sono, que vez por outra arregala os olhos numa expressão meio psicótica, e dentro do garrafão se comporta como uma legítima mala sem alça.
Em certas noites, Duncan só é percebido ao fim da partida, quando voltamos a atenção para a frieza dos números. Sempre se esquivando dos holofotes, ele aprendeu a cultivar uma discrição letal. Age invariavelmente escorado em cautela, causando um estrago silencioso que corrói o adversário por dentro.
Quem é capaz de entender esse estilo ao mesmo tempo sereno e agressivo? Talvez o próprio jogador, formado em psicologia pela Universidade de Wake Forest. Até nos hábitos pessoais, bem longe dos ginásios, é possível notar este tênue equilíbrio. As sombras introspectivas do filme favorito, O Corvo, contrastam com a imponência da vasta coleção de facas que mantém em casa, dedicando especial cuidado a uma imensa (e caríssima) espada de samurai.
Como uma criança sem receio de expor as fraquezas, Duncan admite que tem medo de altura. Seus adversários também têm. Medo da sua altura. Dos braços longos e cortantes, do poder infalível no ataque e na defesa. Do olhar estranho que congela o marcador. Da extrema habilidade que lhe concedeu a coroa de rei do garrafão. Até o próximo ano, MVP.
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Enquanto Duncan e outras centenas de atletas curtem o merecido descanso, o Rebote também pisa no freio. A partir de hoje, o site passa a ter periodicidade semanal, com textos aos domingos. Episódios especiais, como o draft, exigirão um número maior de textos, por isso não se espantem quando eu quebrar o protocolo e voltar a escrever com mais freqüência. Se tudo correr bem, ficaremos nesse ritmo até o início da pré-temporada, em setembro.
Agradeço aos amigos que passaram por aqui neste ano de estréia, desde aquele que deu uma rápida olhada nos textos até os guerreiros que mantiveram o sangue da página pulsando nas caixas de comentários. Sem vocês, nada disso faria sentido. Espero que continuem todos por aqui.
Até domingo.
Um grande abraço,
Rodrigo Alves
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(Foto – CBS Sportsline)
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