16.11.03
pílulas de genialidade
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))) Miller lembrou ontem que ainda está vivo
Entre os inúmeros fenômenos que subvertem a lógica do esporte, um dos mais curiosos é a armadilha da longevidade para os atletas de elite. A idade acumulada soa como a pior das ameaças para quem foge da aposentadoria como o diabo foge da cruz. Por isso, muitos jogadores arrastam suas carreiras além da conta, principalmente os que guardam na biografia momentos de glória. Mesmo velhos, sonham repetir performances do passado.
Vira e mexe, conseguem.
As fileiras do basquete abrigam uma série de “ex-craques em atividade”; gente que não conserva nem metade do rendimento apresentado nos bons tempos. A lista é farta e inclui nomes de peso como Dikembe Mutombo, Alonzo Mourning e Scottie Pippen. Com o peso dos aniversários nas costas, essa turma se contenta com papéis secundários e fica ali, recarregando as pilhas, para mostrar serviço esporadicamente.
Um desses lampejos estava escondido entre os dez jogos da rodada de sábado. Era uma visita rotineira do Indiana Pacers ao New York Knicks. Deveria ser apenas mais um duelo entre um time que vai bem e outro que vai mal.
No entanto, paira no ar uma certa química que causa reações imprevisíveis quando Reggie Miller e o Madison Square Garden cruzam seus caminhos. Ontem, foi assim.
O mais idoso dos quatro Millers em atividade na NBA teve outra noite memorável no ginásio que lhe serve como segunda casa. Marcou 31 pontos. Ora, só 31? Diante dos 51 recentes de T-Mac, pode parecer pouco, mas Reggie não fazia 30 numa noite há quase dois anos. Mesmo em fim de carreira, ele provou que o talento continua ali guardado para casos de emergência.
Cinco rebotes e três assistências completaram as estatísticas de um dos maiores gatilhos da liga, que ontem converteu seis bolas de três em sete tentativas. Ainda no primeiro período, a síndrome do Madison já se anunciava. Miller parecia mais entusiasmado que o normal: ao acertar um tiro da zona morta, gritou e virou-se para trás, comemorando com os colegas do banco.
O que se seguiu foi a tradicional clínica de arremessos. Com a frieza dos velhos tempos, o Indiana emperrou uma reação do New York, que chegou a fazer 24 pontos seguidos. Na hora da verdade, com o show do veterano garantido, foi a vez do garoto Jermaine O’Neal, que teve uma péssima noite, mas decidiu a parada com a cesta final.
Para a torcida nova-iorquinha, deve ter sido inevitável recordar lances históricos que Reggie protagonizou naquele templo. Foi ali que ele conseguiu um dos feitos mais extraordinários da história do basquete, convertendo oito pontos em nove segundos e virando o placar para 107-105 numa partida de playoff, em 1995. Lembro que fiquei estarrecido ao ver o episódio, ao vivo, pela TV.
Um ano antes, ele havia marcado 25 pontos no quarto período de um jogo 5 da Final do Leste. Em 1998, também nos playoffs, foram 38 pontos, incluindo um belo disparo de três para forçar a prorrogação.
Reviver esses momentos faz a atuação de ontem parecer algo menor. Mas era o velho Reggie Miller que estava lá. Assim como o velho Mutombo também estava, e converteu um tapinha na reta final que daria a vitória aos Knicks se não fosse a resposta imediata de O’Neal. O velho Alonzo, o velho Pippen, o velho Divac e outras criaturas de idade avançada vão continuar aí por algum tempo.
Agora, o craque (alguém arrisca dizer ex-craque?) dos Pacers vai descansar um pouco. Quem sabe, até o fim da carreira, ainda há tempo para mais uma exibição de gala.
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foto . nbae
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